Nos vivemos ate morrer - By: Thomas Cale

18:52



Fic:
Obs: A fic é narrada por Fred Weasley. e tudo se passa depois das Relíquias da Morte.



 Ronald Weasley olhou pela janela de casa. Chovia muito lá fora. A tempestade havia descoberto um meio de saber a hora certa para cair. A Toca estava em luto. Mesmo estando dentro de casa, todos eram atingidos pela atmosfera que habitava o jardim lá fora. A chuva caía para todos. 

 Um silêncio recaía sobre todos os que moravam naquela casa humilde. O que não era comum. A lareira estava acesa e o senhor e a senhora Weasley tomavam chá em frente à ela. Harry e Gina estavam abraçados no sofá. A ruiva deixava cair lágrimas silenciosas e o moreno a consolava, acariciando seus cabelos e beijando sua testa vez ou outra.

 Jorge e Carlinhos jogavam xadrez de bruxo. Percy estava lendo o Profeta Diário. Quanto à ele, estava debruçado na janela, observando a chuva cair lentamente e copiosa pelo jardim. Um terrível silêncio. 

 Seus olhos se encheram de lágrimas ao lembrar o porquê de toda aquela situação. Ele nunca chorara tanto desde a minha morte. E agora mais uma morte para assombrar a família Weasley, como se já não bastasse. Rony virou-se e foi se sentar na poltrona ao lado da de Percy. Os olhos marejados do ruivo caíram sobre a aliança prateada que usava no dedo anelar da mão direita. 

 Rony e Hermione estavam noivos à algum tempo, ambos com vinte e um anos, pretendiam se casar. Estavam guardando dinheiro para comprar uma casa em Oxford, em um bairro bruxo. Hermione havia se tornado uma escritora de livros para trouxas. Rony era o gerente do banco Gringotes. Tudo estava mais do que perfeito. Mas algo deu errado, ou certo; ele não poderia dizer. 

 E agora nenhum dos dois tinha mais certeza de nada.

  Um soluço particularmente alto veio do segundo andar. Isso o fez esconder o rosto nas mãos. Da última vez que Hermione chorou alto desta maneira fora quando Bellatriz a torturou à quatro anos. Neste dia, ela correra para os braços de Rony, chorando. E quando eles já se encontravam no Chalé das Conchas, após aparatarem, ela sorriu, enquanto lágrimas ainda caíam pelo seu rosto. “Aqueles monstros não vão conseguir acabar comigo tão facilmente”, Hermione havia dito a ele. 

 Rony não tinha mais certeza se ela iria sorrir desta vez. 

 Seu olhar ainda choroso caiu em sapatinhos de bebê, que se encontravam na mesa de centro. Eram azuis. Um menino. E suas lágrimas escaparam, enquanto ele começava a soluçar baixinho. 

 Percy baixou o jornal e encarou o irmão com pena. Rony pôde ouvir a irmã começar a chorar com mais vontade no ombro de Harry, que a abraçou mais apertado. A Sra. Weasley fungou, e seu marido tomou-lhe a mão. 

 Mais um soluço veio do cômodo de cima, seguido por um grito abafado, mas ainda assim podia ser escutado. 

 Hermione com certeza era a que mais sofria com aquilo. E ele nada podia fazer com relação à dor que ela sentia. Rony chorou um pouco mais alto. Era inevitável. 

 - Rony, escute... – era Percy. – Eu... eu sinto muito. – ele disse, dando tapinhas consoladores no ombro de Rony. 

 O ruivo levantou a cabeça para encarar o irmão mais velho e não tentou esconder as lágrimas que caiam pelo seu rosto. 

 - Não sinta. – respondeu com a voz embargada. – Morrer não é nenhuma vergonha. 

 Percy se calou. Jorge e Carlinhos tentavam se concentrar no xadrez, mas ambos deixavam seu olhar correr para a escada que levava para o cômodo de cima. Seus olhares eram penalizados. 

 Finalmente, Hermione perdeu o controle de si mesma. O choro que vinha do segundo andar agora podia ser ouvido por todos. Os soluços eram quase gritos. 

 Ronald se levantou e avisou:

 - Eu vou vê-la. 

 - Rony, ela pediu para ficar sozinha. – Gina o avisou. 

 - Não me interessa. – retrucou, andando em direção à escada. 

 Um grito abafado ecoou pela casa novamente. A Sra. Weasley limpou as lágrimas que caiam de seus olhos. 

 A escada. Ao subir o primeiro degrau, ele estremeceu. Passar pela escada havia se tornado um trauma. Rony se lembrava perfeitamente do dia em que ele se levantou da cama e observou uma Hermione linda e grávida o chamando da porta para tomar café da manhã. 

 Ela estava tão linda. Saudável. Seus cabelos arrumados em um rabo de cavalo mal-feito, alguns fios caindo no rosto rosado. Seus olhos castanhos brilhavam de felicidade. Sua barriga já ressaltada com os cinco meses de gravidez. 

 Como sempre acontecia, ele tentava faze-la corar de manhã. Parecia uma adolescente quando corava. Quando estavam ao pé da escada para descer, ele começou a beijar-lhe o pescoço, logo após virando-a e tomando seus lábios para si. 

 Rony nunca chegou a beijar-lhe os lábios naquele dia, pois ao virá-la, ela perdeu o equilíbrio e desceu rolando escada abaixo. Bateu a barriga. Ficou inconsciente. Quase imediatamente um sangue que não era dela jorrou. Aborto instantâneo.

 Desde que voltara do St. Mungus à dois dias, Hermione não parara de chorar e nem saíra do quarto. Se ele dissesse que trocaram duas palavras desde a morte do bebê, Rony estaria mentindo. 

 Ele chegou ao fim da escada e se dirigiu para o quarto que era dele, onde Hermione estava. Podiam-se ouvir os soluços que vinha de dentro do quarto, mesmo com a porta fechada. Tomando coragem, Rony bateu duas vezes.      

 Ninguém respondeu, mas o choro não cessou. Rony entrou assim mesmo. A cena que viu ficaria gravada em sua mente para sempre: Hermione deitada em sua cama, abraçando a barriga agora lisa, os joelhos apertados contra o peito, lágrimas caindo de seus olhos, os lábios trêmulos, soluços escapavam deles. 

 Pela milésima vez em dois dias, ele chorou. Fechou a porta atrás de si e andou até a cama. Quando se sentou, a morena pareceu nota-lo, pois se jogou em seus braços, escondendo o rosto em seu pescoço e chorando ainda mais abertamente, se é que isso era possível. 

 - Shh... – ele fazia, enquanto acariciava os cabelos e as costas de Hermione. Rony escondeu seu rosto nos cabelos cheios dela, chorando um pouco menos histérico. - Acalme-se. - ele pediu. - Vai passar, vai passar. - ele prometia. 

 Por alguma razão, isso pareceu irritá-la. Hermione se soltou dele e disse, com a voz cheia de raiva:

 - Vai passar?! - exclamou, respirando com dificuldade, sentada em frente ao ruivo, na cama. - Ronald, você sabe o que aconteceu? Tem a mínima idéia? - ele apenas balançou a cabeça afirmativamente, enxugando as próprias lágrimas. Sabia que ela estava nervosa e precisava desabafar. - Você tem idéia do que é ser inútil a sua vida inteira e então... alguém finalmente te dá um motivo para viver, para continuar seguindo em frente? 

 - Hermione, eu... - Rony começou, mas ela o interrompeu, apontando o dedo para o peito dele. 

 - Você me deu um motivo maravilhoso para que eu pudesse viver... e eu o perdi. Eu engravidei e de repente eu tinha dois motivos para continuar vivendo: você e o nosso filho. Quando eu soube que carregava uma vida dentro de mim, eu tive a impressão de que estava ali para cuidar daquele bebê. Para salvá-lo. E no final... eu não consegui! - e ela voltou a soluçar. 

 Rony levou as mãos ao rosto de Hermione, limpando as lágrimas, mas outras caíam. 

 - Não pode ficar se culpando desse jeito... - ele disse. 

 - Você sabe o que eu sinto?! Você sabe o que eu sou agora?! - ela levou a mão à barriga. - Me sinto oca. Não há nada dentro de mim. Eu sou completamente inútil. Ninguém precisa de mim. 

 - Isso não é verdade. - Rony discordou ao ver Hermione esconder o rosto nas mãos. Ele retirou as mãos dela de seu rosto e levantou seu queixo, para que a morena o encarasse. - Eu preciso de você. 

 Ela balançou a cabeça negativamente. 

 E então Rony compreendeu uma verdade mórbita. Se ele não a tivesse girado tão bruscamente, ela não teria perdido o bebê. Ele entendeu que Hermione o culpava. E isso o machucou profundamente, como uma ferida inflamada que foi reaberta e agora sangra. 

 - Você me culpa. - declarou. Não era uma acusação. Nem uma pergunta. Era apenas a declaração da verdade. 

 Hermione o olhou horrorizada, enquanto Rony abaixava a cabeça. 

 - Eu não culpo você, Rony. - discordou. - Eu jamais seria capaz disso. - ela levantou a cabeça dele, para que a encarasse. - Nunca mais pense uma coisa dessas, entendeu? Nunca. Eu só posso culpar a mim mesma. Preciso de você. Forte. - suas lágrimas cessaram. - Prometa que não vai pensar mais nisso. 

 Rony suspirou. 

 - Prometo. - disse. - Mas também não quero que se culpe. 

 - Eu não me culpo. Eu só... não consigo entender. 

 - Dói, não é? - perguntou ele. 

 - Muito. - confirmou com a voz embargada e ela voltou a chorar. 

 Hermione se deitou na cama novamente na mesma posição em que Rony a havia encontrado quando entrou no quarto. Ela parecia tão frágil. Tão pequena. Ele queria protegê-la, queria poder dizer que traria o bebê de volta, queria poder amenizar a dor que ela provavelmente sentia no coração, queria poder arrancar o seu próprio para não ter que sentir a dor de mais uma perda. 

Sem dizer mais nada, Rony se deitou ao lado de Hermione, puxando a mulher para seu peito, onde ela se acomodou, molhando a camisa dele com suas lágrimas. 

 E ele não pode evitar se lembrar do dia em que ela fora torturada por Bellatriz. Rony se lembrava de ela ter chorado em seu peito e molhado sua camisa. Lembrava-se de tê-la consolado por horas a fio, quando ela se lembrava da dor. Será que Hermione demoraria demais para sorrir?

 Então, o ruivo a abraçou, acariciando seu cabelo e suas costas. Vez ou outra ele derramava uma lágrima, mas não se preocupou em limpá-la. Quanto mais pensava no filho que não tinha conhecido, mais furioso e triste ele se encontrava. Triste pela sua morte. Furioso pelo fato de não poder dar à ele um enterro decente. 

 Rony fechou os olhos e se perguntou se a dor passaria. 

 Ele sentiu Hermione sucumbir ao sono. Ela havia dormido em seu peito, o rosto finalmente tranqüilo, uma última lágrima escapando pelo canto de seus olhos fechados. Rony se perguntou se não deveria dormir também. Afinal, Hermione não fora a única que passara as duas última noites em claro. E ele estava exausto. Mas sentiu responsável por guardar o sono da morena. Se ela tivesse algum pesadelo, ele queria estar presente para poder acordá-la e consolá-la. 

 Rony pensou no lindo garotinho de olhos castanhos e cabelos ruivos, com um sorriso amável como o de Hermione, com sardas nas bochechas e no nariz, tão inteligente quanto a mãe. E percebeu que esse mesmo garotinho nem mesmo nascera. Ele não entendia como Deus era capaz de tantas coisas, mas não foi capaz de salvar uma criança. 

 Com esses pensamentos, Rony fechou seus olhos e caiu num sono tão profundo quanto o da mulher ao seu lado. E todas as dores, os ressentimentos com Deus e o mundo, foram postos de lado para serem analisados mais tarde. A dor é apenas do momento. 

 Talvez o tempo não cure totalmente a ferida, mas ele com certeza pode suturá-la. 

 Ambos ali adormecidos não se deram conta de que eu os observava mais perto do que o necessário. E que um menininho de olhos castanhos e cabelos ruivos sorria abertamente para mim, apontando os pais que dormiam e acenando para eles. 

 Meu irmão talvez nunca entenda que tudo o que eles estão passando agora seja passageiro. E que o garotinho que vivia dentro de Hermione agora vive em um lugar bem mais bonito e fácil do que o mundo. 

Ambos ainda tinham muito o que viver. Nenhum dos dois perdoaria Deus por terem levado alguém tão especial. Mas o que eles não sabem é que foi garotinho de olhos castanhos e cabelos ruivos quem escolheu não ter nascido, por medo do mundo. 

 E nenhum deles podia imaginar que uma certa garotinha chamada Rose estava louca para nascer. 



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