14/05/2015

13:00

não desejo isso a ninguém. eu sinto a dor da kelly só em olhar para ela. usando uma roupa preta, o cabelo amarrado sem vida, os olhos vermelhos de tanto chorar. depois eu olho para o pedrinho, e ele está sorrindo, mas quieto, tão diferente daquele bebê agitado que ele é. 

o joab morreu. o marido da minha prima e pai do meu afilhado. está morto. 

ele morreu por um erro de um agente penitenciário. e ele era um agente penitenciário.

eu me sinto tão mal. me pergunto como vai ser o futuro da minha prima sem o marido, do filho dela sem o pai. é uma sensação tão horrível. 

ontem, quando ele estava na UTI, eu passei a noite pensando nele e rezando, pedindo para que tudo ficasse bem. mas no fundo, eu sabia que aquele leve desespero, que eu sentia por saber que ele estava na UTI, ia passar. eu tinha quase certeza que ele ia sair de lá bem. então hoje, eu acordei e fui para a escola, eu tinha três provas. quando saio da sala da prova e olho para o meu celular, vejo novas mensagens no grupo da minha família. “as 16h, no parque memorial” era a mensagem mais recente. e o mundo pareceu cair e eu me senti sem ar. logo comecei a chorar e depois de tentar ligar para a minha irmã, vou procurar pela minha mãe - a mesma trabalha no meu colégio. mas quando chego na sala dela, uma funcionária olha para mim e diz que ela foi embora. essa é quase a confirmação de que algo realmente aconteceu, mas eu ainda pergunto “então é verdade? ele morreu?” e ela confirma, enquanto os meus amigos me abraçam. eu só pensava na kelly e no primo que eu havia acabado de perder.

me lembro de que fui a primeira da família a conhecê-lo, quando ele e a Kelly estavam no início do namoro. lembro de quando ele conheceu o meu pai e eles viraram amigos, tão amigos que o joab até pediu para o meu pai ser padrinho de batizado dele (ele não era batizado, pois seus pais eram evangélicos, então ele precisou se batizar para casar na igreja católica com a minha prima). lembro de quando eles casaram, minha mãe foi madrinha deles e eu fui a porta aliança, junto com a minha irmã, e também lembro de perder a aliança dele uns minutos antes de ter que entrar na igreja, e achar depois de alguns minutos de desespero. me lembro de cada aborto que a kelly sofreu antes de finalmente ficar grávida do pedrinho.  me lembro de ir ao parto da kelly, tão feliz, e me lembro de ser convidada para ser a madrinha uns meses atrás. e também me lembro de ir ao batizado no início do mês. lembro-me de pensar em tudo isso ontem, quando ele ainda estava entre nós. hoje ele não está mais. 

depois que o meu pai foi me buscar na escola, ele me levou para casa, onde eu troquei de roupa e depois ele me trouxe para a casa da minha tia, onde todos estão. assim que eu vi a minha irmã sentada no sofá, as lágrimas voltaram e a minha respiração já estava descontrolada, mais uma vez. “fique calma antes de ir falar com a kelly”, ela disse e eu me obriguei a parar de chorar. demorei uns 20 minutos.

quando eu fui ver a minha prima, que estava deitada na cama com o bebê, eu sentei ao seu lado, apreensiva. poucos segundos depois e eu já estava deitada ao lado dela, abraçando o seu corpo e não pude deixar de voltar a chorar enquanto escutava as suas fungadas baixinhas. eu disse que a amava, mas eu me sentia tão inútil. eu me sinto tão inútil.

eu estou tão preocupada com ela. e com o bebê. ele completou 6 meses há 3 dias atrás. apenas 6 meses e ele já não tem pai.

é uma situação tão triste que eu não desejo a ninguém. e o pior é que não há justiça sobre o caso. os culpados não falam sobre o caso, e como o caso teve tanta repercussão, há tantas mentiras envolvidas. cada noticiário fala uma historia diferente, e isso não ajuda em nada. isso tudo é uma merda.

descanse em paz, Joab. você estará sempre em nossos pensamentos e tenha certeza que eu falarei de você para o pedrinho. sentirei sua falta, primo.

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